O Brasil detém cerca de 65% de sua matriz energética oriunda de fonte hidráulica e, para entender a dinâmica de preços do mercado de energia, é fundamental olhar para os céus. Infelizmente, o sistema hidrelétrico brasileiro vem passando por um longo período de forte estresse. Desde 2012, os reservatórios vêm operando com níveis baixos, devido à uma combinação de escassez de chuvas, crescimento da demanda e escolha de política energética ao privilegiar a expansão em usinas sem reservatórios.
Na última década, o país passou por uma grande crise hídrica, principalmente nos anos de 2014 e 2015, que tiveram um nível consideravelmente menor de chuvas na temporada úmida (outubro a abril). Nos anos seguintes, 2016, 2017 e 2018, as chuvas se normalizaram, no entanto, não o bastante para recuperar o déficit gerado nos anos anteriores.
Neste início de 2020, os reservatórios operam em níveis preocupantes. Com exceção da região Nordeste, a primeira quinzena deste ano figura entre os níveis mais baixos dos últimos 20 anos, sendo nas regiões Sul e Norte os piores resultados do período.
Nível dos reservatórios da região Sudeste no mês de janeiro*
Nível dos reservatórios da região Nordeste no mês de janeiro*
Nível dos reservatórios da região Norte no mês de janeiro*
* Números referentes aos dias 31/1 de cada ano com exceção de 2020, que foi calculado até o dia 15/1
O período úmido atual, que se iniciou em outubro de 2019 e seguirá até abril de 2020, não começou bem. As chuvas iniciais de outubro e novembro foram abaixo da média e não serviram para umedecer o solo, que, até então, estava seco. Como veremos nos gráficos abaixo, janeiro apresentou um nível de chuva melhor. Porém, a situação é preocupante, uma vez que não tem chovido nos grandes reservatórios das bacias do Rio Grande e Paranaíba e, historicamente, os meses de março e abril não compensam esse déficit de chuva.
Nos gráficos acima é possível comparar o início do período úmido anterior com o atual. Em 2018, a maior parte da primavera (outubro e novembro) contou com bastante chuvas. Já em 2019, este mesmo período foi muito seco. O mês de dezembro de ambos os anos foi bastante ruim em termos de chuvas. Para se ter uma ideia do efeito disto, o ano de 2019 começou com a Energia Natural Afluente (ENA) em torno de 80% no Sudeste e com o nível de reservatório em 28,8%. Já em 2020, neste início de ano, o ENA está em 50%, e com menos de 20% de reservatório.
O início de 2020 está menos seco, se comparado ao mesmo período do ano passado, porém a chuva ocorreu em bacias onde quase não há armazenamento. Especificamente no Sudeste, até o dia 14/1, os reservatórios estavam operando em 21% do total de seu armazenamento. A expectativa é que esse nível aumente em velocidade muito baixa.
As usinas hidrelétricas da região Sudeste são responsáveis pela produção de cerca de 60% da energia hidráulica do país e onde se encontram os principais reservatórios do Brasil, e foi justamente nessa região que a chuva permaneceu abaixo da média nos últimos meses. O ano de 2019 registrou, pelo 8° ano consecutivo, a entrada no período úmido com os reservatórios em condições críticas.
Projeta-se que no restante de janeiro chova acima da média nas regiões Norte e Nordeste. Já no Sudeste, o nível de chuvas deve ficar bem próximo à média histórica, porém com volumes menores onde encontram-se os reservatórios. Ou seja, o sistema deve se recuperar, mas de forma lenta e sem significativa reposição da capacidade de armazenamento do sistema hídrico. Devido aos fatores mencionados, o preço da energia elétrica no Mercado Livre de Energia deve continuar mais pressionado em fevereiro. Esse longo período de estresse e a baixa capacidade dos reservatórios torna o sistema elétrico sempre refém da chuva dos meses seguintes.
Aqui na Stima, continuaremos monitorando as condições meteorológicas e seus impactos nos preços do setor elétrico. Além desta análise climática, 2020 trouxe outras importantes mudanças que impactarão o setor, como a entrada do segundo bipolo da Usina de Belo Monte e mudanças metodológicas no modelo Newave, que analisamos em artigo recente. Nele pontuamos a importância das novas linhas de transmissão entre as regiões Norte e Sudeste para o atendimento da carga desta região com geração das usinas de Belo Monte, Jirau e Santo Antônio. Em anos com baixo volume de chuva na região Sudeste durante o período úmido, esta interligação será fundamental para atender a carga do país com mais segurança, poupar os reservatórios do Sudeste e evitar o acionamento de usinas térmicas.
Outra ferramenta que complementa estes esforços é o iStima, índice que criamos e é definido a partir dos produtos mais negociados no Balcão Brasileiro de Comercialização de Energia – BBCE, com foco naqueles de maior liquidez. Como afirmamos no lançamento do iStima, a Stima é uma empresa que investe consideravelmente em sistemas, modelagem matemática e meteorologia, o que tem nos possibilitado análises acuradas do comportamento de preços do mercado.
Autor:
Alexandre Nascimento
Middle Office Analyst – Stima Energia
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